segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O xerife da Pio XI




Na foto, a dupla dinâmica, Vladen e Valentina
(essa história eu publiquei na CartaCapital, também em dezembro. É sobre um desses figuras que toda grande cidade tem. Vladen, o "xerife" da rua Pio XI)
Quem passa pela rua Pio XI, no alto da Lapa, zona oeste de São Paulo, mais dia menos dia vai reparar a presença de um homem robusto, de roupas cáqui, óculos aviador e chapéu de caçador, a subir e descer a rua numa bicicleta cheia de apetrechos.

Os 130 quilos e o 1,86 metro de altura de Vladen Mencinauskis Nogueira, de 39 anos, chamariam a atenção por si só. Mas a figura só fica completa com sua “Valentina”, a valente bicicleta paramentada com equipamentos tais como buzina de caminhão, duas sirenes diferentes, um guarda-chuva, duas lanternas e um cabo de vassoura coberto por fita isolante, a se passar por cacetete. “Falam que eu tenho pinta de policial”, gaba-se. Ele conta que, por ser grandalhão, aos 15 anos já fazia informalmente a segurança de um cartório, no centro.
Antes de chegar à Pio XI, foi vendedor e corretor de linhas telefônicas. A convite de um cunhado, fez o “patrulhamento” de uma rua, no Parque São Rafael, sudeste da cidade. Intercalava essas ocupações com trabalhos em empresas de segurança. Numa delas, fez o curso específico para a função e tirou o porte de arma.

Vladen estudou apenas até o primeiro grau, e compensa a deficiência na formação com o interesse em aprender, a peculiar simpatia e um afiado senso de oportunidade. Estava na própria Pio XI quando ouviu o comentário de que a rua vinha sendo alvo de assaltos e iriam contratar seguranças. “No dia seguinte, peguei meu currículo, convoquei uma reunião e fechei com 15 clientes”, conta. O empreendimento começou com cinco funcionários e rondas 24 horas por dia, mas encolheu “com a flutuação de inquilinos”.

Há um ano é o próprio Vladen quem faz a ronda diária, além da “cobertura de entrada e saída dos clientes”, a bordo de Valentina. Significa basicamente acompanhar a abertura e o fechamento do comércio, passar o cadeado nas correntes, conferir se as câmeras de segurança estão intactas, conhecer os funcionários pelo nome (os transeuntes freqüentes, de vista) e estar sempre de prontidão. “À paisana, posso me passar por um civil e surpreender”, acredita, e explica: “Meu intuito não é confrontar, é espantar. O bandido quer agir às escuras. Ele me vê, não sabe quem eu sou e acaba desistindo”. Note-se que a Pio XI é íngreme, então não é raro ele aparecer algo ofegante.
Na frente de uma clínica oftalmológica, ele observa os pedestres. Cumprimenta quase a metade dos que passam. E ensina: “Quem anda olhando para frente, em linha reta, é trabalhador. Vagabundo olha pra todo lado, está sempre procurando alguma coisa”.

Após a saída da última funcionária, é hora de fazer a cobertura (ou conter o trânsito para o carro sair da garagem) da saída do oftalmologista Mauricio Della Paolera, que diz: “Ele é tranqüilo, cuida das funcionárias e põe a molecada pra correr. Antes, tinha muito assalto, agora não. O cara olha e sabe que a clínica não está sozinha”.

Consultório dentário, curso de mergulho, imobiliária, curso de inglês, escola infantil, loja de móveis, tinturaria. É longa a lista dos 25 clientes de Vladen, sem contar os “colaboradores”. Gente como o auxiliar terceirizado Adriano Trindade, de 22 anos, há oito meses na Pio XI. Adriano vive de orientar quem chega de carro ao Sebrae para se dirigir ao estacionamento. “Eu pensava que ele só andava de bicicleta, depois é que soube que fazia esse serviço”, diz o rapaz. E Vladen, orgulhoso: “Está vendo? Ninguém sabe o que eu faço”. Em seguida, fila de Adriano um dos muitos cafezinhos do dia. E segue a ronda.
Alguns metros acima, passa a corrente em outro estabelecimento, não sem antes verificar, pelo vidro fumê, se está tudo em ordem no escritório. Antes de se dirigir ao próximo ponto, detalha mais a rotina. A Pio XI sofre com furtos de relógios de água, “alguns têm cobre dentro, por isso levam”, com a ameaça das pichações, “eles têm uma marca registrada, cada uma é uma gangue. Procuro identificar essas marcas para saber quem responsabilizar”, e com os acidentes com motoboys, “eles são abusados, vão na contramão. Mas, quando tem acidente, sou o primeiro a ligar para a PM e para a CET”.

Se um mendigo decide se instalar na rua para dormir, Vladen usa de diplomacia: “Digo ‘meu amigo, você tem que sair. Tem duas praças aí embaixo’, e, na boa educação, eles saem. Com pedintes é a mesma coisa, oriento a procurarem uma igreja”. Certa noite, uma dupla de crianças de rua dormia ao relento. “Entreguei as duas na porta de um abrigo da prefeitura aqui perto. Criança na rua não pode”, diz, todo coração.

Mas ele também pode ser duro, conforme descreve em jargões policiais: “Em um assalto a automóvel, cheguei em apoio: chave-de-braço até a chegada da polícia”. Vladen credita aos cursos que fez o conhecimento de defesa pessoal, mas Steven Seagal também tem parte nisso. O xerife é fã do ator-lutador: “Gosto bastante, inclusive aprendi muitos golpes de arte marcial nos filmes dele”. Também é fã de Chuck Norris.
Se já sonhou em ser policial? “Não, porque sempre ganhei mais do que um cabo da PM.” A florescer nas deficiências do Estado, a segurança presencial-informal-camarada de Vladen converte-se em cerca de 2 mil reais por mês. Ele critica a burocracia e as exigências para abrir uma firma. “Sabe o que dói? O governo, o Ministério Público, chamarem meu serviço de clandestino. Pôxa, levei todos os meus documentos para o batalhão do bairro, me credenciei na Polícia Civil, mas, infelizmente, a Federal não aceita”, resigna-se. Além do desprezo oficial, Vladen convive com as empresas de segurança que fazem vigilância motorizada. A um toque de celular, em um minuto aparece na esquina Ederaldo Ferreira de Oliveira, numa moto. Ele ainda não tinha visto Vladen, então este aciona uma de suas sirenes, uól-uól-uól, e é rapidamente localizado. Trocam um aperto de mão e se despedem.

Ele segue na Pio XI e divaga, satisfeito: “Pelo meu cargo, sou um chefe de segurança do pedaço, alguns até me chamam de xerife”. Em seguida, se diz espiritualista e emenda: “Troco um pneu, empurro carro quebrado, recolho cachorro perdido, tiro bêbados do meio da rua, aviso se a luz do poste queimou... Faço tudo com gosto, pois tenho que dar o máximo de exemplo”. A jurisdição fantástica de Vladen vai do número 150 ao 824 da Pio XI, mas só durante o expediente. “Depois do serviço, adoro tomar uma cervejinha no bar Bururu. É quando a Valentina passa a ser movida a álcool”, ri o Steven Seagal da Lapa.

3 comentários:

Unknown disse...

espero estar certo de que sejas a pessoa que procuro meu nome eduardo trabalhamos juntos na area de seguranca a uns vinte anos atras

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

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