segunda-feira, 17 de maio de 2010

entrevista com Torero - parte 2 (saiu na ordem errada...)

Falando de seleção. O que você acha

desse time de europeus, desconhecidos,

com a camisa amarela?

Diminuiu muito o amor pela seleção.

O Juca (Kfouri) fez uma pesquisa sobre

isso. Prefiro ver um jogo do Santos

do que da seleção.

Prefere o Santos campeão brasileiro do

que o Brasil hexacampeão?

Aí fica difícil, porque Copa é bom, né?

(Pensativo) Mas acho que sim.

Isso é irreversível ou pode mudar?

Agora tem esses caras voltando, Fred,

Adriano, vários. Isso melhora muito o

futebol. Fica mais fácil suportar o jogo e

escrever depois. Não vejo muito jogo

chato, tento escapar. Uma vez a Globo me

convidou para ser comentarista. Fui, fiz

um Botafogo e São Paulo e não voltei. É

chato demais. Um jogo chato do seu time,

tudo bem, mas dos outros é muito ruim.

Quase não vejo jogos que não quero.

Quando fui repórter (de esporte naFolha,

em 87), cobria o São Paulo, um time ótimo:

Silas, Müller, Bernardo... Mesmo assim,

cobrir o jornalismo esportivo não tem

muita variante. Ganhou, tudo feliz.

Perdeu, tudo triste.

Por que a cobertura é assim?

Melhorou muito. E piorou muito. Hoje

tem menos jornalista amigo de jogador,

que falava bem porque era padrinho do

filho e tal. Tem mais números, às vezes

exagerando, como a própria Folha, mas

os dados têm sua lógica, sua graça. Por

outro lado, se perdeu muito a parte

pessoal. O que eu gosto do futebol são as

gentes. O torcedor é o que há de mais

bacana. Na década de 70 a Placar tinha

perfis espetaculares de jogadores, dava

para saber como esses caras pensavam.

Hoje não tem essa proximidade, o

jogador não é muito mais gente. Não se

sabe direito qual é a do Neymar. Ele vai

na igreja mas grita “Eu sou foda” depois do gol. Tenho que conhecer esse cara,

um popstar de 18 anos. Hoje o jornalista

vai pouco a campo, não tem muito

contato com as torcidas, fica na coletiva

e só. O Washington tem uma livraria.

Então ele não é só um centroavante que p

erde um monte de gols? O jornalismo

esportivo perdeu o personagem, um

certo calor que tinha. Mas melhorou

a investigação. Hoje se descobre alguns

escândalos, antes era zero.

Você se aproxima da política do Santos?

Entrei como sócio agora, há duas semanas.

Veio de falar com leitores do blog e

perceber que eu estava muito omisso. Mas

não entro (na política), não. Me convidam

para assistir com o presidente, na tribuna,

mas não posso ceder. É feio. Ao ceder a

uma puxação de saco, você recebe um jabá

e fica devedor.

Você publicou no blog o dossiê do Odir

Cunha para resgatar os títulos

brasileiros anteriores a 71. Como está

essa batalha?

Estacionou. Entregaram para o Ricardo

Teixeira mas ele está levando em banho-

maria. Não tem lógica existir essa

diferença. O nome não pode ser, porque o

Brasileiro já teve vários nomes. São todos

Brasileiros, né? Na Europa fizeram assim.

Quem ganhou em 1916 se compara a quem

ganhou em 1996.

Por que isso não é revisto?

Por interesse. O Palmeiras vai ganhar

muitos títulos, o Santos também. E a CBF

não quer problema com ninguém. Mas é

muito óbvio que devia. Assim como para os

outros times é muito óbvio que não (risos).

A poucos meses da África do Sul, o que

você acha que teremos em campo?

Vamos ver. É um time sólido, com caras

talentosos.

Igual em 2006.

Mas não era sólido, né?

Isso só se viu depois.

Nos treinamentos já dava para ver. Não

tinha coletivo, titulares contra reservas, os

caras não se conheciam. No primeiro jogo se

viu que estava um lixo. No terceiro, com os

reservas, estava legal. Fred melhor que

Ronaldo, Robinho melhor que Adriano,

Cicinho melhor que Cafu,... Mas o cara não

teve coragem. Deixou os veteranos de

sempre, ficou ruim. Mas essa (Copa) vai ser

boa. A seleção será mais parecida com a do

Parreira, de 94, mas melhorada. É muito

sólida na defesa, mas tem mais talento e é mais ofensiva. Tem Kaká, Robinho, Luís

Fabiano bem à beça...

Neymar tem que ir?

Não sei. Entendo totalmente o Dunga. Ele

leva o que deu certo com ele: Júlio Baptista

em vez de Ronaldinho Gaúcho. Se o Neymar

continuar jogando assim, fica convocável.

Está tão bom quanto o Robinho hoje em dia.

Talvez eu o levasse.

É bom pela tradição de levar um caçula?

É um investimento no cara.O Fenômeno foi

assim em 94, Pelé foi assim em 58.O

Bismarck foi para a Copa também. Alguém

lembra do Bismarck? Não!(risos) Não deu

certo (em 1990). Ele era do Vasco, depois foi

para o Japão e nunca despontou.

2010 também é ano de eleições. Como

você vê esse cenário?

Se pensarmos que temos Dilma, Serra, Ciro

e Marina, é muito melhor do que quando tínhamos Aureliano Chaves, Maluf...

De certa forma, a direita doida dançou.

Infelizmente esquerda utópica também.

Deu uma centralizada que deixou tudo

meio sem graça. Serra ou Dilma não fazem

tanta diferença, até na antipatia (risos).

Talvez eu esteja falando isso porque estou

ficando velho... (pensativo) Podia ser

muito melhor. Quando eu tinha 18 anos

e pichava “Lula” com spray era mais

divertido. Fui bem petista, fiz programas

de televisão para ele, roteiros de graça...

E que tal o desempenho dele?

(Lula) É um cara bacana ainda. Ficou muito no

meio campo. Podia ter sido um tremendo

centroavante e acabou mais ali na

armação, é meio triste. Podia ter feito uns

golaços de bicicleta. Mas deu uns bons

lançamentos, compôs o meio-campo. Não

é terrível. Talvez vote na Marina no

primeiro turno, mas com desconfiança por

ela ser evangélica. Não é um voto alegre.

MAKING OF:

Não foi difícil marcar a entrevista com Torero, bastando coincidir um dia em

que estivesse em São Paulo sem compromissos pela manhã. Santista de nascença

geográfica, ele vive meio lá meio cá. A entrada de visitantes em sua morada paulistana

é anunciada com um gorjear de passarinhos. Fiquei de perguntar se a campainha

é ideia dele mas esqueci. Equipado com apenas o pouco e o necessário, o apê é o

de um homem solteiro e dividido. Durante a conversa, uma outra divisão surgiu diante

de mim. Entre o autor inteligentíssimo e muito tímido e o garoto que faz as piadinhas

mais bobas da sala de aula. Foi divertido. Torero tem seu próprio blog e um outro,

o do Lelê — um sobrinho fictício que surgiu na Copa de 2006 e angariou o dobro

de pageviews que seu tiozão graças à sua curiosidade infantil e, por isso mesmo,

encantadora. A conversa foi rápida, mas posso arriscar que existam muitos outros

meninos dentro deste homem incomodado com seus cabelos brancos.